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Reportagem de capa

Da selva de pedra para a floresta urbana: alforria!

Às vésperas de estrear na CATVE, Olga Bongiovanni diz que a idade agrega sabedoria libertária e fala abertamente das propostas indecentes ouvidas na “Selva de Pedra”.

Da selva de pedra para a floresta urbana: alforria!

Afase “selva de pedra” da apresentadora Olga Bongiovanni se deu na virada do milênio, com início em 1999, na capital paulista. Convidada para atuar em rede nacional na Band, ela se tornou o nome cascavelense mais projetado no país, condição que se mantém até hoje, 26 anos depois.

De volta à cidade que lhe ofertou o primeiro microfone, a apresentora cultivou e expandiu sua presença nas redes sociais com quase 900 mil seguidores, retornou ao rádio com a CBN e agora passa a conciliar a participação na TV Evangelizar com as multiplataformas da CATVE.

Olga recebeu a equipe do Pitoco em sua bucólica residência que ocupa dois terrenos encravada na região do bairro Cancelli. Um dos lotes está designado para as inúmeras plantas da apresentadora. Ali tem de tudo, de ervas medicinais a frutíferas, com direito a uma imensa trepadeira que praticamente cobre toda a área frontal da casa.

Há muita vida ali. Pássaros, borboletas e uma infinidade de outros bichos, incluindo os de quatro patas, como os doguinhos Pepe e Lola, além de dois felinos que “surgiram do nada” e se aninharam no local.

É a floresta urbana da Bongiovanni, como era tratada pela apresentadora Hebe Camargo, uma das pessoas que a recebeu na paulicéia desvairada. Foi assim, da selva de pedra à floresta urbana que a conversa fluiu ao som dos cliques e flashes do premiado repórter fotográfico Sérgio Sanderson.

Aqui estão os principais trechos da entrevista com ênfase ao sentimento de alforria de caráter transversal e etário, expressão utilizada pela apresentadora que superou a barreiras das 70 primaveras com o mesmo espírito da menina nascida em Capinzal, “interior do interior” do Brasil profundo.


A “LATINHA”

O rádio sempre foi minha grande paixão, minha escola. Rádio é prestação de serviço, entretenimento, informação em tempo real. Sempre levei profissionais renomados para conversas educativas no rádio, médicos e advogados consagrados, gente cuja consulta pode custar R$ 500 a quem não pode pagar. Isso é oferecer prestação de serviço ao ouvinte, é o papel do rádio e também da TV.


ONTEM E HOJE

Fazendo uma linha do tempo do início da carreira no rádio - quando as pessoas ligavam para o telefone fixo da emissora a partir de um orelhão após depositar uma ficha telefônica - para os dias de hoje, eu digo que nossa responsabilidade aumentou muito. Eu vi telespectador colocar palha de aço na antena para assistir a Olga, ou furar o assoalho, passar fio terra para ouvir o programa de rádio. Era outro mundo.


POSTURA

Quando cheguei a São Paulo conversei com o Fernando Mitre, diretor da Band, para entender a filosofia da casa. Ele disse que não havia censura, o que se pedia era discernimento, bom senso, fatos. Isso tornou as coisas mais fáceis. Nunca tive que fazer retratação na minha carreira profissional, sempre ouvi os dois lados antes de por no ar, me limitei aos fatos, minha opinião talvez não interesse ao telespectador.


GIGANTISMO

Quando atuei em rede nacional entendi o tamanho do Brasil, eu não tinha ideia. Já nos primeiros dias deixei um endereço de email no ar para conexão com a audiência. Saí do ar e abri a caixa de mensagens. Fiquei mais de duas horas lendo emails. Era gente da Bahia, gaúchos, catarinenses, acreanos, então percebi a responsabilidade que eu estava assumindo e para quem eu estava falando. Antes eu falava para minha aldeia, hoje, com as novas tecnologias, fala-se para o mundo.


REDES E ALFORRIA

Sim, tenho muitos seguidores e procuro interagir com eles, mas não serei escrava do algorítmo. Ele faz o que quiser, eu farei o que eu quero. Não vou fazer o que está na moda, vou fazer o que gosto. Ao chegarmos aos 70 anos de idade, surge uma coisa que chamo de alforria. Se ao chegar em um lugar as pessoas vão notar meu carro, roupa, calçado, bolsa, jóias, dane-se! Não devo nada para ninguém, sou desapegada com o material e isso me deixa feliz.


PAPO COM HEBE

Me recordo quando a Hebe Camargo me recebeu em minha chegada a São Paulo. Ela disse: “Eu sei o que é vir do interior, ser uma anônima e começar do nada nesta cidade”. Pensei comigo: - estou aqui, ela me acolheu. Eu era aquela mulher de 45 anos com medo, ciente da responsabilidade. Aprendi muito, batalhei demais, fui escrava do relógio e de muito coisa, mas hoje estou livre, alforriada.


HORA DO F*DA-SE

Sim, no primeiro momento tive medo. A gente tem medo quando tem 40 anos e a vida profissional, econômica, ainda a consolidar. Medo de dizer não, se disser aquela porta pode fechar, tenho que engolir ou terei problemas, preciso daquele salário para pagar os boletos, tenho que dizer sim. Mas a vida e a idade trazem um momento em que você diz: Foda-se! Eu sou livre e dona de minha vida, e você não tem poderes sobre mim.


ASSÉDIO SEXUAL

Tive problema de assédio moral e sexual, foi horrível, mas sobrevivi. Não tive que ir para a cama de ninguém para crescer na profissão, mas sofri. Quando mais vivemos, mais nos fortalecemos, a idade com maturidade nos dá esse conhecimento. Se eu tivesse cedido ao assédio não estaria aqui. Talvez estivesse bilionária, ou na valeta. Mas não é de dinheiro que se trata, é de dignidade e profissionalismo.


TER E SER

Aprendi a dizer não também para o consumismo, a ostentação. Há quem precise ostentar, precisa ser olhada na festa, que comentem o vestido de milhares de reais, mansão, bolsa de grife, viagens incríveis, carros de luxo, ter, ter e ter. O ser fica em segundo plano. É gente se endividando para parecer o que não é. Vai por mim, você pode ser feliz com menos bagagem para carregar.


DINHEIRO

Se enriqueci na carreira? Tenho dinheiro para a conta da luz, da água, da internet, para chamar o carro de aplicativo, para o supermercado, o plano de saúde. Sim, minha profissão me ofereceu uma vida confortável e digna. Mas prefiro a simplicidade. Quando as pessoas me encontram na rua elas dizem: - nossa, você é igualzinha aqui e na TV. É uma questão de autenticidade, ser quem você é de verdade.


NOVOS DESAFIOS

Estou desenhando o programa na CATVE. Fiquei muito feliz com o convite do Jorge Guirado. Troco ideias com ele, tenho um caderno em que vou anotando meus insights. Já estou com 12 páginas rascunhadas à mão, e não é tudo, tem muita coisa ainda para ir ao papel. Gosto de papel e caneta, anoto tudo.


A GENTE POD

Esse será o nome do programa que irá ao ar nos sábados, “A Gente Pod”, com o “d” mudo mesmo. Vou trazer o hino nacional de volta. Sem conotação política nenhuma. É um quadro que levei ao ar lá em 1999, muito antes dessa polarização política insana. Era assim: chegava a segunda-feira as pessoa diziam: - Viram a transmissão do futebol? Boleiro cantando errado o hino, mascando chicletes… Aí surgiu a ideia de ir à praça pública e premiar quem cantasse corretamente.


SÍMBOLOS POLITIZADOS

Sei que pode haver outras conotações ao trazer o hino de volta. Mas não venham me dizer que estou atrelada a esse ou aquele lado, esse partido ou aquele. O hino é meu, é seu, de todos nós, a bandeira é nossa, nenhum grupo político pode se adonar dos símbolos nacionais. Aprendi pequena lá em Santa Catarina a respeitar os símbolos da pátria, retomo o desafio do hino desincumbida de qualquer vínculo partidário.


A RECEITA

Não tem muito segredo, é trazer com leveza a pauta do comportamento, entretenimento, alegria, mensagens espirituosas, a boa gastronomia, cantar, dançar e, principalmente, proximidade, conexão com a audiência. A TV, em grande medida, se afastou do público. José Bonifácio Sobrinho, ninguém menos que o Boni, maior especialista em TV, sempre disse: aproxime-se do seu público.


OLGA POR OLGA

Essa resposta é complexa, quem sou eu? Cozinheira, lavadeira, passadeira, a mulher que limpa o chão, organiza a dispensa, paga os boletos, concede entrevistas, cuida do jardim, vai ao mercado, lê livros e o Pitoco, interage nas redes e apresenta programas. Isso me faz feliz, isso é lilberdade, sou uma mulher muito feliz.